CORDA AMARRADA NO SUMO SACERDOTE ?
Você provavelmente já deve ter escutado alguém falar que o Cohen
Gadol (O Sumo Sacerdote) quando adentrava o Kadosh haKadoshim (O Santo dos
Santos), a parte mais sagrada do Mishkan (Santuário), no Yom Hakippurim
(Lev. 23:27), literalmente O Dia das Expiações, se utilizava de uma corda para puxá-lo caso ele morresse por alguma eventualidade, mas será
que tal alegação tem fundamento bíblico?
O QUE DIZ A BÍBLIA?
VESTE PARA ARÃO (SUMO SACERDOTE) - Êxodo
28:1-5
Depois tu farás chegar a ti teu irmão
Arão, e seus filhos com ele, do meio dos filhos de Israel, para me
administrarem o ofício sacerdotal; a saber: Arão, Nadabe, e Abiú, Eleazar e
Itamar, os filhos de Arão.
E farás vestes sagradas a Arão teu irmão,
para glória e ornamento.
Falarás também a todos os que são sábios
de coração, a quem eu tenho enchido do espírito da sabedoria, que façam
vestes a Arão para santificá-lo; para que me administre o ofício
sacerdotal.
Estas pois são as vestes que farão: um
peitoral, e um éfode, e um manto, e uma túnica bordada, uma mitra, e um cinto;
farão, pois, santas vestes para Arão, teu irmão, e para seus filhos, para me
administrarem o ofício sacerdotal. E tomarão o ouro, e o azul, e a
púrpura, e o carmesim, e o linho fino.
DETALHE: As
vestes sagradas de Arão são para uso exclusivo da função de Sumo Sacerdote, não
podendo ser utilizado pelos Sacerdotes, tendo em vista que exerciam funções
distintas.
Neste post não irei adentrar ao mérito das funções
de Sumo Sacerdote e dos Sacerdotes, nem da importância e quesitos do Dia das
Expiações, porém se faz necessário destacar de forma sucinta o aspecto desse
Grande Dia.
Em suma, a sua essência e seu elemento principal é a entrada do Sumo Sacerdote no Santo dos Santos para queimar o incenso e borrifar o sangue do sacrifício, para expiar e purificar o povo judeu uma vez por ano. Os preparativos para a entrada do Sumo Sacerdote no santuário interno, sua purificação, suas roupas especiais e as ofertas que ele sacrifica em seu nome e em nome da congregação de Israel, todos esses são os componentes do serviço de Yom Kipur. O serviço culmina com a expiação e purificação de todo pecado, iniquidade e transgressão.
Os dois aspectos da purificação e expiação estão entrelaçados. Por um lado, o Sumo Sacerdote, que é o agente do povo judeu, ascende ao mais alto nível de santidade e alcança o santuário interior. Por outro lado, o pecado e a iniquidade são removidos e lançados fora do povo judeu. O ritual que simboliza esses dois aspectos da expiação atinge seu clímax ao serviço das duas cabras do Yom Kipur. Neste serviço, cabras gêmeas são trazidas para participar de uma loteria. Um deles expressa a sublime santidade purificadora, e seu sangue é trazido para o Santo dos Santos, enquanto o outro, que simboliza todos os pecados e iniquidades do povo judeu, é enviado para fora do templo, para fora da área estabelecida para o deserto, para Azazel (Lv 16; Lv 23; Nm 29).
Vamos adiante!
Antes de verificarmos como surgiu toda essa
história, é preciso entender alguns detalhes:
O Talmud (Yoma 8b e 18a) declara que, no final do período do
Segundo Templo, a maioria dos sumos sacerdotes era inadequada para a santa
tarefa. Muitos compraram ou subornaram suas posições - e alguns, aparentemente,
morreram no primeiro ano de sua nomeação.
Discorre o Talmude:
“Como eles (os sacerdotes) estavam dando dinheiro
(para serem designados para o Sumo) Sacerdócio, eles eram substituídos a cada
doze meses.”
Mas de onde foi extraída a ideia de uma corda
amarrado no Sumo Sacerdote?
O pensamento em tela se extrai do ZOHAR, que descreve a preparação que o sumo sacerdote realiza em Yom Kipur quando ele está prestes a entrar no Santo dos Santos.
Você deve estar se perguntando: o que é
Zohar?
O Zohar foi composto na Espanha da Idade Média (c.1100 - c.1400
CE), O ZOHAR (Esplendor ou Resplendor) é o trabalho fundamental na
literatura do pensamento místico judaico conhecido como Cabalá. É um grupo
de livros, incluindo COMENTÁRIOS sobre os aspectos místicos da Torá (os cinco
livros de Moisés, pentateuco) e interpretações das escrituras, bem como
material sobre misticismo, cosmogonia mítica e psicologia mística.
O Zohar no COMENTÁRIO da Parashá Acharei Mot (67a) descreve a
preparação do Sumo Sacerdote antes de entrar no Santo dos Santos e afirma que
"uma corrente de ouro estava presa à perna".
“... ele deveria entrar em um lugar mais santo do que todos. Os
outros sacerdotes, os levitas e o povo ficaram ao redor dele em três fileiras e
ergueram as mãos sobre ele em oração, e uma corrente de ouro foi amarrada
à perna. Ele deu três passos e todos os outros pararam e não o
seguiram mais. Ele deu mais três passos e deu a volta em sua casa; mais três e
ele fechou os olhos e se ligou ao mundo superior.”
Em outro COMENTÁRIO do Zohar, vol.16, da Parashá Emor (102a), Seção
34. Yom Kipur, par. 251, a descrição da entrada do Sumo Sacerdote no Santo dos
Santos inclui esta declaração: “Rav Yitzchak disse: uma corda foi
amarrada à perna do Sumo Sacerdote quando ele entrou, para que, caso ele
morresse lá, eles poderia tirá-lo.”
Todavia, outras fontes não fazem menção a uma corda, Rambam não o
menciona no Yad Hachazakah, nem nenhum outro Rishonim o discute. Não é
mencionado no Ashkenazic Avodah piyyut "Amitz Koach" (por volta do
século X) nem no mais antigo sefardita Avodah piyyut "Atah Konanta".
Além disso, vale a pena notar que a corda não é mencionada nos Apócrifos, nos
Manuscritos do Mar Morto ou Pseudoepígrafos. Finalmente, uma das melhores
testemunhas oculares das atividades de Beit Hamikdash, Flávio Josefo, deixa de
notar a existência de tal corda.
Mister salientar que tal história não está posta no Talmud, tão
somente no ZOHAR, sendo assim, existem 02 (duas) referências textuais à
história.
Vejamos ainda, algumas fontes que relatam eventos que sugerem que
não havia corda:
A Gemara (Yoma 53b) relata que: "havia
um Kohen Gadol que recitou uma longa oração enquanto estava no Heichal
(edifício principal do santuário). Seu colega Kohanim assumiu que ele
havia morrido e decidiu entrar no Heichal para procurá-lo".
Por uma questão obvia, o comentário implica que não havia corda.
Por uma questão obvia, o comentário implica que não havia corda.
Como se pode notar no comentário
supr,a devido a longa oração (tefilá) realizada pelo Sumo Sacerdote se fez
necessário adentrar o Santuário para saber o que houve com o Sumo Sacerdote,
tendo em vista que o Sumo Sacerdote deveria realizar uma breve oração para que não
se configurasse uma presunção de possível morte.
A
Gemara (Yoma 53b) discorre:
O mishná declarou que o sumo sacerdote não estenderia sua
oração. Os Sábios ensinaram em Tosefta :
Houve um incidente envolvendo um certo Sumo Sacerdote
que estendeu sua oração, e seus companheiros sacerdotes fizeram um
voto, contaram e decidiram ir atrás dele com
a preocupação de que ele havia morrido ou desmaiado e necessitado de
assistência. . Eles começaram a entrar e naquele momento ele
emergiu. Eles disseram-lhe: Por que você estendeu sua oração? Ele
lhes disse: Por que não? Incomoda-lhe que eu orei por você e
pelo Templo não ser destruído? Eles disseram-lhe: Não crie o hábito de
fazê-lo, como aprendemos: ele não estenderia sua oração, para não alarmar o
povo judeu, que poderia temer que ele tivesse morrido.
O rabino Chiya relata (Yoma 19b) que: "uma vez quando um Tzeduki Kohen Gadol ainda estava no Heichal, os que estavam
do lado de fora do Azarah (pátio do templo) ouviram um som e assumiram que um
anjo o havia atingido. Eles entraram no Heichal e o encontraram morto."
Mais uma vez, a implicação é que não havia uma corrente ligada a esse Kohen Gadol.
Mais uma vez, a implicação é que não havia uma corrente ligada a esse Kohen Gadol.
Também há problemas haláchicos com a
corda. Pode constituir uma peça de vestuário extra que invalida o serviço. Se
colocado sob as roupas de Kohen Gadol, seria um chatzitza; se terminasse,
impediria seus movimentos.
Se a corda é uma corrente de ouro, e
não uma corda comum, existem outros problemas haláchicos, como espalhar tumah e
usar ouro no Yom Kipur.
Então, por que o Zohar menciona uma
corda ou corrente? O rabino Uri Sherki explica isso como ALEGÓRICO:
"O Kohen Gadol, ao
entrar no Kodesh Hakodashim em Yom Kipur, pode ficar tão impressionado com o
espiritual que ele é capaz de "esquecer" de sair. O Zohar usa a
imagem de uma "corda" como um lembrete para o Kohen Gadol de que o
povo judeu precisa dele e ele deve "recuar" de volta a este mundo
após a extraordinária experiência sobrenatural de Yom Kippur."
Isto posto, supondo que um Sumo
Sacerdote morra no Santo dos Santos em Yom Kipur, não haveria necessidade de
arrastá-lo por uma corda, porque seu corpo poderia simplesmente ser removido
por outro Cohen, um Levi ou até um Yisrael, se necessário (Eruvin 105a):
“Os Sábios ensinaram em um
baraíta : É permitido para todos para entrar no Santuário para
construir, reparar, ou para remover impurezas de dentro. Contudo, sempre
que possível, a mitzva (mandamento) é que essas tarefas sejam executadas
pelos sacerdotes. Se não houver sacerdotes disponíveis, os levitas entram;
se nenhum levita estiver disponível, os israelitas entrarão. Nos dois
casos, se forem ritualmente puros, sim, poderão entrar, mas se forem impuros,
não, não poderão entrar no lugar santo.”
Face ao exposto, espero ter auxiliado num melhor entendimento de um
mito obscuro que se desenvolveu na idade média e sofreu o efeito papagaio,
todavia, não encontra amparo no Talmud, na Mishná e muito menos nas Escrituras
/ Tanach (Antigo Testamento).
Shalom, Shalom, que o Eterno vos abençoe.
- Zayit Ben Yossef


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